Protestos em centenas de cidades do país

Os atos contra o governo da presidente Dilma Rousseff (PT) foram realizados em mais de 195 cidades de 25 estados do Brasil e no Distrito Federal. Também foram registrados eventos fora do país, a exemplo de Alemanha, Irlanda, Portugal e Espanha. Em todas as unidades da Federação, o número de manifestantes foi menor do que aquele registrado no protesto em 15 de março. Em Porto Alegre, por exemplo, segundo informações repassadas pela Polícia Militar, 25 mil pessoas participaram dos atos. No ato do mês passado, a PM apontou quase o dobro de manifestantes. Houve apitaço, panelaço e palavras de ordem pedindo a renúncia da petista. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também foi alvo dos protestos.

Os manifestantes ocuparam a região do Parcão, na área central da cidade. Vestidos de verde e amarelo, grande parte com a camisa da Seleção Brasileira de futebol, usaram faixas e carros de som para propagar palavras de ordem contra a corrupção no governo Dilma.

Em Maceió, capital de Alagoas, onde 6 mil pessoas protestavam contra a petista, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), não foi poupado. Com gritos de “acorda, Renan!”, os alagoanos fizeram, no fim da tarde de ontem, um “apitaço” em frente ao prédio onde mora o político, na Praia de Ponta Verde, um dos bairros mais nobres da capital. No Acre, o protesto não empolgou. Apenas 250 pessoas, segundo estimativas policiais. Na manifestação passada, 5 mil foram às ruas. 

Em Salvador, os manifestantes se reuniram no Farol da Barra. A chuva diminuiu o ânimo do público. A Polícia Militar comunicou que 4 mil pessoas participaram do ato. Em Minas Gerais, além da capital, várias cidades do interior promoveram o “fora, Dilma”. As manifestações tomaram ruas, praças e avenidas de mais de 50 municípios, entre eles cidades-polo como Uberaba e Uberlândia, no Triângulo; Montes Claros, no Norte; Juiz de Fora, na Zona da Mata; Governador Valadares, na Região Leste; Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri; Varginha, no Sul; Paracatu, no Noroeste; e outras. Em Uberlândia, havia 6 mil manifestantes de acordo com dados da PM.

Oposição

Em nota oficial, o PSDB se solidarizou com os brasileiros que voltaram às ruas ontem e também utilizaram as redes sociais. “Mais uma vez, legitimamente, manifestaram seu repúdio e indignação contra a corrupção sistêmica que envergonha o país”. No comunicado, o partido cita pontos frágeis do governo petista. “Além da crise ética e moral, o governo do PT impõe à sociedade a pior equação: recessão com inflação alta, juros altos e corte de investimentos nas áreas essenciais da educação e da saúde”.

A nota chama a atenção para os 100 dias completados da gestão Dilma Rousseff. “As famílias brasileiras sofrem agora os efeitos da crise sobre os principais setores produtivos. Empresas em diversos segmentos deram início a cortes ainda mais severos, transformando o que antes eram preocupações com o aumento do desemprego em realidade concreta”. A legenda afirmou que a presidente da República permanece imobilizada e tentando terceirizar responsabilidades intransferíveis. “O PSDB se une aos milhares de brasileiros que amam o Brasil e que, por isso, dizem não ao governo responsável pelo caminho tortuoso que, neste momento, todos trilhamos.”

A ex-ministra Marina Silva, que disputou as últimas eleições presidenciais, também se manifestou em apoio aos protestos. “Menos gente nas ruas não significa menor insatisfação; ao contrário, pode até significar um aumento da desesperança, o represamento de uma revolta que pode retornar mais forte depois de algum tempo”, postou em sua conta nas redes sociais. Ela cobrou da presidente Dilma Rousseff uma resposta aos atos realizados ontem. “O protesto fornece à presidente da República mais uma oportunidade de responder diretamente, sem terceirizar sua relação com a sociedade. Terá força e disposição para fazer isso? Espero que sim”, afirmou.

Hashtag

Na internet, o PT reagiu. Um exército vermelho realizou manifestações nas principais plataformas das redes sociais. A hashtag #aceitadilmavez, em defesa da gestão petista, chegou a liderar o trendind topics de uma rede social no Brasil e ficou entre os três assuntos mais comentados no mundo.


Um governo desconectado
Com menos de um mês de governo, ainda no fim de janeiro, a presidente da República, Dilma Rousseff, reuniu todos os ministros para pedir a eles que travassem o que chamou de “guerra da comunicação”. Dois meses, ao menos quatro pesquisas de opinião negativas, e duas manifestações depois, o Palácio do Planalto ainda pena para comunicar ao eleitor o projeto que pretende para o país nos próximos três anos e meio. E isso piora uma situação naturalmente difícil pelas denúncias de corrupção, pelo aumento na conta de energia e de combustível e pela disparada do dólar — fora o aperto nos reajustes ao funcionalismo.

Em princípio, o governo federal até pôde comemorar nesse fim de semana a menor adesão às manifestações. Todavia, teve de se debruçar sobre o resultado da pesquisa Datafolha que mostrou 63% da população pró-impeachment. O desconhecimento da população sobre o que ocorreria depois do afastamento da presidente — apenas 12%, segundo o Datafolha, apontam o vice Michel Temer como sucessor — revela que os eleitores desejam uma troca de guarda no Palácio do Planalto, independentemente do que ocorreria depois dela. E isso decorre do fato, principalmente, de o governo não conseguir apresentar posições consistentes que dialoguem com a opinião de boa parcela do eleitorado.

O retrato atual mostra que, divorciada de pessoas que a elegeram, Dilma Rousseff ainda não mostrou um rosto nem um projeto para os próximos três anos e meio de governo. Se nos primeiros quatro anos de poder a petista conseguiu, com sucesso, impor aos eleitores a imagem da faxina ética e, depois, a do Mais Médicos, a atual gestão ainda não tem nem sequer uma semente a oferecer. A imagem de gestora eficiente também não existe mais. O saldo atual mostra um ministro demitido pelo presidente da Câmara e outro que marcou entrevista coletiva para anunciar a nomeação, antes mesmo de ter sido nomeado. A impressão que passa é a de que, se há diálogo no Planalto, ele é feito por pessoas que falam diferentes idiomas.

No cabo de guerra com o Congresso Nacional, o fracasso na comunicação do Executivo ainda é ampliado pelo fracasso político. Até aqui, o Planalto não conseguiu impor a sua agenda e sofreu com os reflexos negativos da aprovação de projetos que tinham a paternidade de senadores e deputados federais. Para piorar, Dilma e companhia devem chegar à sexta-feira com ao menos mais duas derrotas na Câmara, na votação de duas propostas. A primeira, a ser chancelada pelo plenário, é a que abre a porteira para a terceirização no país. A segunda, ainda na Comissão de Constituição e Justiça, restringe o número de ministérios para 20. O Planalto é refratário a ambas, mas deve ver a base aliada aprová-las, sem dar a mínima para a posição do Executivo.

No caso da proposta que amplia a possibilidade de terceirização de trabalhadores no país, a falha na comunicação e de articulação política é mais flagrante. Antevendo a derrota em plenário, o governo entendeu por bem negociar ao menos emendas que não provocassem a perda na arrecadação. Diante da impossibilidade de barrar o projeto, adotou como estratégia minimizar o impacto nas contas públicas — e não comprar nova briga com a base aliada. Não conseguiu uma coisa nem outra. Os deputados ignoraram as alterações sugeridas pela equipe econômica e o Palácio nem sequer conseguiu comunicar à população que era contra o projeto. A votação deve ser concluída na quarta-feira. Caso sigam a toada, os deputados devem levar Dilma Rousseff a terminar a semana com a pecha de ter reduzido direitos dos trabalhadores.


A esperança de reverter o quadro, por ironia, cabe agora a um peemedebista, o vice-presidente Michel Temer. Mas isso introduz outro problema. Ao passo que 63% da população deseja o impeachment, como ficará o Planalto se for justo o primeiro nome na linha sucessória o responsável por salvar o governo do abismo?
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Por Renata Belsantos

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